TRT3 – Dia Nacional dos Surdos (26/9) – Setembro Azul: Empresa é condenada por não fornecer condições de trabalho adequadas a trabalhadora com deficiência auditiva

O Setembro Azul é a campanha que tem como objetivo conscientizar a sociedade sobre os direitos da pessoa com deficiência auditiva, incentivando as iniciativas de inclusão. O Dia Nacional dos Surdos, em 26 de setembro, foi oficializado pela Lei 11.796, de 29 de outubro de 2008, e escolhido por ser a data de fundação da primeira escola para surdos do Brasil, que leva o nome de Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES).

A Justiça do Trabalho mineira tem examinado muitas reclamações envolvendo alegações de desrespeito a pessoas com deficiência auditiva. Um exemplo que ilustra bem essa realidade é o caso da trabalhadora surda que foi contratada para vaga de PCD (pessoa com deficiência) para atuar como recepcionista sem a necessária tecnologia assistiva. Acompanhe:

Uma empresa de serviços hemoterápicos foi condenada a pagar indenização por danos morais por não promover a inserção efetiva de uma trabalhadora com deficiência auditiva. Acompanhando o voto do juiz convocado Alexandre Wagner de Morais Albuquerque, os julgadores da Quinta Turma do TRT-MG mantiveram, por unanimidade, o entendimento adotado pelo juízo da 5ª Vara do Trabalho de Juiz de Fora, apenas reduzindo o valor da indenização para R$ 5 mil.

A trabalhadora foi contratada para vaga de PCD (pessoa com deficiência) e alegou não ter conseguido as adaptações necessárias para atuar como recepcionista. A empresa, em seu recurso, argumentou que buscou todas as formas possíveis para integrá-la ao ambiente de trabalho. Afirmou que o local de trabalho e a função foram compatíveis com a condição de PCD e que a própria trabalhadora concordou em exercer o cargo de recepcionista.

Ao analisar o caso, o relator deu razão à trabalhadora e reconheceu o dever de indenizar por parte da empregadora. Segundo apurado, a autora possui surdez parcial e faz uso de aparelho auditivo bilateral. Ela foi colocada para trabalhar na recepção, para atender o público e as ligações, ou seja, em local onde frequentam os clientes. Além do barulho das ligações, a empregada também tinha que conviver com o barulho das falas dos clientes. A autora comunicou ao coordenador sobre suas dificuldades no setor de trabalho e foi encaminhada para outro setor na recepção, onde também tinha atendimento de telefone e presencial. A empregadora, no entanto, não promoveu adaptação para as necessidades especiais da empregada.

Para o julgador, houve descaso da empresa em relação à deficiência. “Ora, a reclamada, mesmo após a comunicação da reclamante, não forneceu condições de trabalho adequadas à deficiência da reclamante, permanecendo as mesmas dificuldades, sem que tenham sido proporcionados mecanismos que facilitassem a prestação de serviços”, destacou no voto.

Na visão do relator, a trabalhadora foi submetida a tratamento desrespeitoso ao ser exposta ao barulho no ambiente de trabalho sem que fosse observada a condição de perda auditiva. O relator citou trechos da sentença para fundamentar a conclusão:

“Não houve a inserção efetiva, ao desqualificar a reclamada e seus setores de gestão as solicitações da reclamante quanto às características de seu ambiente do trabalho, ou seja, ao seu meio interacional enquanto pessoa com deficiência. Não é pelo fato de a obreira portar aparelho auditivo que sua deficiência possa ser ignorada, na perspectiva de um capacitismo pouco problematizado.  Afinal, PCD’s possuem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, devendo seu ambiente ser adaptado para aprimorar a sua saúde e evitar incapacidades”, destacou.

Em outro trecho, o juiz de primeiro grau havia registrado que “a violência simbólica da prática empresária beira à prática discriminatória quando não promove a integração e a inclusão de PCD’s, para apenas e tão somente cumprir quotas legais. Falha a medicina do trabalho, o setor de gestão de pessoal, e, quiçá, a psicologia do trabalho, acaso existente em estabelecimento hospitalar”.

Ao fundamentar o voto, o relator também mencionou julgado do TST, nos seguintes termos:

“(…) RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR. DANOS MORAIS CAUSADOS AO EMPREGADO. CARACTERIZAÇÃO. PESSOA COM DEFICIÊNCIA. RECUSA DO EMPREGADOR À PROMOÇÃO DE ADAPTAÇÕES RAZOÁVEIS. A responsabilidade civil do empregador pela reparação decorrente de danos morais causados ao empregado pressupõe a existência de três requisitos, quais sejam: a conduta (culposa, em regra), o dano propriamente dito (violação aos atributos da personalidade) e o nexo causal entre esses dois elementos. O primeiro é a ação ou omissão de alguém que produz consequências às quais o sistema jurídico reconhece relevância. É certo que esse agir de modo consciente é ainda caracterizado por ser contrário ao Direito, daí falar-se que, em princípio, a responsabilidade exige a presença da conduta culposa do agente, o que significa ação inicialmente de forma ilícita e que se distancia dos padrões socialmente adequados, muito embora possa haver o dever de ressarcimento dos danos, mesmo nos casos de conduta lícita. O segundo elemento é o dano que, nas palavras de Sérgio Cavalieri Filho, consiste na ‘[…] subtração ou diminuição de um bem jurídico, qualquer que seja a sua natureza, quer se trate de um bem patrimonial, quer se trate de um bem integrante da própria personalidade da vítima, como a sua honra, a imagem, a liberdade etc. Em suma, dano é lesão de um bem jurídico, tanto patrimonial como moral, vindo daí a conhecida divisão do dano em patrimonial e moral’. Finalmente, o último elemento é o nexo causal, a consequência que se afirma existir e a causa que a provocou; é o encadeamento dos acontecimentos derivados da ação humana e os efeitos por ela gerados. Conforme amplamente dirimido no tópico anterior, a empresa, ao ignorar a sua responsabilidade e função social, que a impede de ser apenas fonte geradora de lucro, perdeu uma grande oportunidade de valorizar-se não apenas junto à autora, como também na comunidade interna e, sobretudo, junto à sociedade. Com efeito, ao se recusar a implementar condições de trabalho adequadas à empregada com sérias restrições de locomoção , decorrentes de uma paralisia cerebral, o Banco réu não exerceu seu direito potestativo de acordo com a finalidade social que deveria ser respeitada, cometendo verdadeiro abuso. Como se constata na hipótese, o dano sofrido corresponde ao desgaste e frustração da autora diante da incerteza e da ausência do trabalho. Além da privação do sustento e do exercício de atividade produtiva e remunerada. Tal situação de aflição psicológica é o sofrimento humano experimentado no presente caso. Evidenciado o dano, assim como a conduta culposa do empregador e o nexo causal entre ambos, deve ser reformado o acórdão regional que, a despeito de reconhecer a ocorrência da situação fática acima descrita, excluiu da condenação a reparação por danos morais. (…) Recurso de revista conhecido e provido” (RR-1076-13.2012.5.02.0049, 7ª Turma, Relator Ministro Claudio Mascarenhas Brandão, DEJT 03/05/2019).

Nesse contexto, o relator confirmou a condenação da empresa à reparação de danos morais. Entretanto, os julgadores deram provimento ao recurso para modificar o valor da indenização fixado na sentença, reduzindo-o para R$ 5 mil. A quantia foi considerada “mais condizente com a situação fática dos autos e extensão do dano, situação econômica das partes e caráter pedagógico que se pretende imprimir à medida, atendendo aos parâmetros de proporcionalidade e razoabilidade”, finalizou o voto condutor. O processo foi remetido ao TST para exame do recurso de revista.

Nos acompanhe no Instagram.

Talvez você goste: