José Higídio
Tiago Angelo
O fim da vigência de uma ação afirmativa sem a avaliação de seus efeitos e do resultado alcançado destoa da garantia existente na Constituição da construção de uma sociedade justa e solidária, com a erradicação das desigualdades sociais, sem preconceito de raça e cor e outras formas de discriminação.
Esse entendimento é do Plenário do Supremo Tribunal Federal, que formou maioria nesta quinta-feira (13/6) para prorrogar a validade do modelo atual de cotas raciais para concursos públicos. A decisão vale até que o Congresso conclua a votação sobre o tema e o governo sancione novas regras.
O caso é analisado no Plenário Virtual da corte até esta sexta-feira (14/6). A prorrogação foi inicialmente determinada no fim de maio pelo ministro Flávio Dino, em decisão liminar.
A discussão se refere ao artigo 6º da Lei 12.990/2014, que estabeleceu o período de dez anos para o encerramento da política de reserva de vagas em concursos públicos. O prazo se encerrará no próximo dia 10.
O Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) e a Rede Sustentabilidade solicitaram ao STF a manutenção da política de cotas. Segundo os partidos, não houve a efetiva inclusão social almejada com a iniciativa.
As legendas também argumentaram que a limitação das cotas aos concursos que ofereçam três ou mais vagas inviabiliza a implementação da política para determinados cargos públicos, que, historicamente, não oferecem mais de duas vagas por edital.
Voto do relator
Dino manteve os fundamentos de sua decisão de maio. Até o momento, seu voto foi acompanhado pelos ministros Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Cristiano Zanin, Edson Fachin e Dias Toffoli. Não há divergência aberta.
O relator apontou que o fim da vigência da ação afirmativa sem a avaliação de seus efeitos e do resultado alcançado destoa de promessas da Constituição quanto à construção de uma sociedade justa e solidária, com a erradicação das desigualdades sociais e de qualquer forma de discriminação.
Segundo Dino, desde o início, quando a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) propôs o projeto que se transformou na norma, a lei tinha como finalidade criar um marco temporal para a avaliação da eficácia da ação afirmativa, o que possibilitaria seu alinhamento e o fim da vigência das cotas caso elas atingissem seu objetivo.
No entanto, de acordo com o ministro, não é possível saber se a política é mesmo necessária sem a avaliação de seus efeitos. Ele também destacou que levantamentos, inclusive feitos pelo Senado, apontam a necessidade do prosseguimento da política de cotas.
O relator notou que o fim do prazo de vigência da lei de 2014 está próximo, “o que pode implicar violação do princípio da segurança jurídica, bem como ao concernente à vedação de retrocesso social”.
O Congresso começou a discutir um novo projeto para atualizar as regras sobre o tema. O texto amplia a reserva de vagas de 20% para 30%. Porém, a proposta enfrenta resistências e não deve ser aprovada em definitivo antes do segundo semestre. Segundo Dino, a tendência de demora para a tramitação do texto justifica a prorrogação do prazo.
“Tal fator configura suficientemente o perigo de grave dano a normas constitucionais, em virtude da natural extensão do processo legislativo em curso. Lembro, ademais, que há concursos em tramitação, e o fim repentino das cotas geraria insegurança jurídica, com elevada probabilidade de multiplicação de litígios judiciais.”
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ADI 7.654
José Higídio
é repórter da revista Consultor Jurídico.
Tiago Angelo
é correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.