3ª Turma entendeu que medidas coercitivas atípicas podem ser admitidas para forçar o pagamento da dívida
O magistrado pode e deve admitir ações de coação ou indução do devedor para cumprimento da obrigação judicial que lhe foi imposta. A partir desse entendimento, a 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região (AM/RR) deu provimento ao recurso de um trabalhador para autorizar a suspensão e a apreensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e do passaporte dos sócios de uma empresa de prestação de serviço terceirizado em Manaus (AM). O processo está em execução há sete anos.
A decisão da Turma Recursal foi por maioria de votos e não é mais passível de recurso porque expirou o prazo no último dia 22 de setembro. O autor da ação é um agente de portaria dispensado sem justa causa em novembro de 2015, que acionou a Justiça do Trabalho para receber as verbas rescisórias. Houve acordo nos autos, mas a empresa não quitou o pagamento parcelado, o que deu início a execução em março de 2016.
Decisão do STF
Ao relatar o processo, o desembargador José Dantas de Góes enfatizou que todas as medidas típicas para o pagamento da dívida já foram adotadas, mas se mostraram infrutíferas. Ele contextualizou o recente posicionamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a matéria ao julgar a ADI 5941, que reconheceu a constitucionalidade de utilização de medidas atípicas coercitivas, para assegurar o cumprimento das ordens judiciais. Como requisitos essenciais, o STF delimitou a comprovação da efetividade e da proporcionalidade desses atos.”No caso dos autos, relativamente à efetividade da medida, deve se ter em mente que o crédito trabalhista possui natureza alimentar, presumindo-se, portanto, a urgência para a satisfação”, pontuou.
Outro ponto destacado no julgamento refere-se à interpretação do Código de Processo Civil (CPC), aplicável subsidiariamente ao processo trabalhista. De acordo com o relator, quando há comprovação de que a medida adotada poderá coagir ou mesmo induzir o devedor a quitar o débito, pode-se falar, a princípio, em efetividade do ato judicial, o que guarda correlação não apenas com o disposto no art. 4º, do CPC, que assegura às partes o direito à “atividade satisfativa”, mas com toda a principiologia do processo do trabalho.
Ele acrescentou que, na esfera trabalhista, o magistrado está autorizado, inclusive, a iniciar a execução de ofício, nas hipóteses previstas em lei, dada a natureza alimentar e super privilegiada do crédito devido ao trabalhador. Como exemplos, citou as hipóteses de inscrição do nome do executado nos órgãos de proteção ao crédito ou no Banco Nacional de Devedores Trabalhistas (BNDT), sem contar a possibilidade de protesto das dívidas trabalhistas.
Proporcionalidade
Também foi destacado pelo desembargador José Dantas de Góes o alinhamento das decisões judiciais que visam satisfazer o direito do credor com a garantia de direitos constitucionalmente assegurados ao devedor. “Assim, no que tange à proporcionalidade da suspensão da CNH e apreensão do passaporte, verifica-se que não há informações nos autos de que os devedores se utilizem da habilitação para fins econômicos, como instrumento de trabalho”, explicou.
Neste contexto, entendeu que não há violação ao direito de locomoção ou de ir e vir dos devedores, tampouco do direito ao trabalho. Conforme destacado no voto, o que a medida visa é a limitação da comodidade do devedor ao deslocar-se, mas sem impedir o gozo das garantias que lhe são asseguradas pela ordem constitucional.
Entenda o caso
Várias medidas de constrição contra o patrimônio dos devedores foram determinadas pelo juízo de 1º grau. Destacam-se, nos autos, a tentativa de penhora on-line, inclusão no Banco Nacional de Devedores Trabalhistas (BNDT) e diligência para localizar crédito em outro processo. Além disso, a colaboração do Núcleo de Apoio e Execução e de Cooperação Judiciária em mais de uma oportunidade, a desconsideração da personalidade jurídica com admissão de outra empresa e seus sócios, assim como a consulta de imóveis no sistema RIDFT. Outras consultas infrutíferas foram realizadas nos sistemas Renajud e Infojud, como também ao Bacen e à Jucea, além da pesquisa patrimonial pela ferramenta Sniper.
Notificado para apresentar elementos inéditos para prosseguimento da execução, o trabalhador pediu a suspensão e a apreensão da CNH e do passaporte dos sócios da empresa. Ao ter o pleito indeferido em março de 2023, recorreu por meio de agravo de petição. O acórdão da 3ª Turma que autorizou a adoção das medidas coercitivas atípicas foi publicado no Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho (DEJT) do último dia 12 de setembro. Assim que for certificado o trânsito em julgado, os autos devem retornar à Vara do Trabalho para prosseguimento das medidas autorizadas em 2º grau.
Processo nº 0002222-73.2015.5.11.0004
Fonte: https://www.sintese.com/noticia_integra_new.asp?id=513801